movimento #1: oficina sobre como amolar facas/quem tem medo da preta que fala como preta?
assento meu corpo sobre os monumentos da cidade colonial. ela me convida à fala cordial e ao silêncio
pacificador. os que possuem a cidade não querem dividir meu desconforto em habitá-la. dizem que não
tenho as palavras certas e nem a literatura completa. dizem que sou violenta, que não há coerência nem
significado no que digo. tentam imobilizar os afetos que minha fala/escrita, situada desde um corpo de
mulher preta, pode gerar. me negam a autodefesa e a autorrepresentação. me roubam a capacidade de
imaginar, o que vem junto com o desmonte da memória das minhas/meus maiores.
afiar a faca e cortar primeiro a própria carne. como escrever para retomar um corpo marcado pelas forças
do racismo, do machismo? como escrever atenta aos investimentos da transfobia, da lesbofobia, do
capacitismo e das muitas forças de colonização que mediam nossa experiência de mundo?
convido todes para, através da escavação e partilha de memórias, sonhos, leituras, escritas, línguas,
vivências e vidências, somar em processos de aquilombamento.
cada encontro terá interlocutoras convidadas, e neste primeiro a bailarina, performer, professora, cineasta
babadeira inaê moreira vai conduzir processos de ativamento das corpas participantes. os encontros
acontecerão em três sessões independentes de dois dias cada, no capacete.
não é pago, não é necessário nenhum grau de escolaridade, os processos de leitura serão coletivos.
neste primeiro encontro vamos apresentar o esboço pensado para o processo, e seguir perguntando: o que
é violência? quem tem medo da preta que fala?
:::esboço:::
• torcer conceitos:
• – fabular memória, relembrar sonhos;
– inventar vocabulário, criar novas línguas;
• operar cortes:
• – abrir o corpo como território político;
– proceder por autópsias, ou a abertura de um campo-corpo de pesquisa;
• costurar tempos:
• – situar o problema ético-estético dentro do contexto político (para além do golpe);
– escavar o passado, especular o futuro para habitar a cidade.
:::insPirações e piratarias:::
“Atrevo-me ao falar-lhe em uma língua que vai além dos limites da dominação – uma língua que não vai
prender você, cercar ou segurá-lo? (…) Nossas palavras não são sem significado, elas são uma ação, uma
resistência. A linguagem também é um lugar de luta (…) Nossa vida depende de nossa capacidade de
conceituar alternativas, muitas vezes improvisadas. Teorizar sobre esta experiência esteticamente,
criticamente é uma agenda para a prática cultural radical. Para mim este espaço de abertura radical é uma
margem – borda aprofundada. Localizar-se lá é difícil, mas necessário. Não é um lugar “seguro”. Se está
sempre em risco. É preciso uma comunidade de resistência (bell hooks, yearning).”
“”É preciso comprometer a vida com a escrita ou é o inverso? Comprometer a escrita com a vida? Na
composição daqueles traços, na arquitetura daqueles símbolos, alegoricamente ela ( a mãe de Conceição)
imprimia todo o seu desespero. Minha mãe não desenhava, não escrevia somente um sol, ela chamava por
ele, assim como os artistas das culturas tradicionais africanas sabem que as suas máscaras não
representam uma entidade, elas são as entidades esculpidas e nomeadas por eles… Nossos corpos tinham
urgências… Era um ritual de uma escrita composta de múltiplos gestos, em que todo corpo dela se
movimentava e não só os dedos… A nossa ESCREVIVÊNCIA não pode ser lida como histórias para
“ninar os da casa grande” e sim para incomodá-los em seus sonos injustos (Conceição Evaristo)”.
Datas: 8 e 9 de junho, das 19h às 21h
22 e 23 de junho, das 19 às 21h
6 e 7 de julho, das 19h às 21h
INSCRIÇØES GRATUITAS VIA EMAIL: residency@capacete.org
Proposta desenhada por cintia guedes.
Inaê Moreira como artista do corpo.
Imagens: carolina calcavecchia fotografando para janaína castro alves (em máquina paranoica, 2017)
mixadas por marie rømer westh